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Pulsão de vida, a mente viva 4v5b44
Jones Figueirêdo Alves
Existem pessoas que não conseguem suprir o vazio de si mesmas, porque não dialogam com a vida e aprofundam esse vazio. A origem do vazio está na própria falta de motivação da vida. Então, algumas pessoas morrem antes de suas mortes, quando esqueceram de viver e não exortam a vida. Morreram e não sabem disso.
Um espaço abissal separa os mortais: (i) os que conhecem o sentido da vida, cúmplices do tempo dialogando com suas experiencias e (ii) os que a deixam escapar a cada minuto, a vida fluindo rápido, à sua revelia. Não constroem o saber das coisas, existindo apenas no superficial, onde habitam as inutilidades.
Os que aprimoram a existência convivem bem com o aprendizado que o tempo ensina. Somos a própria exigência existencial de busca do conhecimento, na pulsão de vida com a mente viva. “A vida é grande demais para ser insignificante” – ponderou Charles Chaplin, acrescentando: “Já vivi tanto que aprendi que a vida é mais do que ar por ela. De fato, ela é muito curta para ser pequena.
O icônico ator que criou e interpretou Carlitos advertia que “o mundo não pertence aos que o contemplam, mas aos que o enfrentam com paixão”. De tal sentir, Chaplin compôs a canção “Smile” (“Sorriso”) originalmente em 1936, para a trilha sonora do seu filme “Tempos Modernos”. A letra, escrita por John Turner e Geoffrey Parsons, somente adicionada em 1954, é uma mensagem de resiliência, sugerindo que “o ato de sorrir pode trazer luz e esperança”.
“Sorria, embora seu coração esteja doendo (Smile, though your heart is aching); Sorria, mesmo que ele esteja se partindo (Smile, even though it's breaking); Quando houver nuvens no céu (When there are clouds in the sky); Você ficará bem (You'll get by); Se você sorrir apesar do seu medo e tristeza (If you smile through your fear and sorrow); Sorria e talvez amanhã (Smile and maybe tomorrow); Você verá o Sol brilhando para você (You'll see the Sun come shining through, for you) (...)”
O próprio personagem Carlitos tem um forte simbolismo de vida. Representa o indivíduo humilde, frequentemente desempregado, marginalizado, tentando sobreviver em um mundo injusto. Ele não tem nome próprio — é “o vagabundo”
— o que o torna universal, um espelho de todos os que lutam para manter sua dignidade diante da pobreza.
Ele também é símbolo da liberdade e do inconformismo. Seu chapéu-coco, bengala e andar desengonçado tornaram-se ícones da liberdade criativa, do artista que desafia o sistema sem dizer uma palavra. Carlitos é um anti-herói poético, que se rebela sem violência, com ironia e charme. Com humanismo e
empatia, é gentil, generoso, sonhador e romântico. Ajuda pessoas cegas, crianças pobres, e sempre tenta fazer o bem. Ele simboliza a resistência da ternura em um mundo brutal. Isso o torna uma figura ética e moral, mesmo que viva à margem da legalidade. Ele é a expressão dos marginalizados que nunca perdem a humanidade.
Diante dos desafios da vida, é preciso que estejamos em estado de consciência ativa. Exercendo uma mente ativa, consciente, criativa e em constante evolução. Uma mente presente, atenta e desperta ao momento atual. Essa vitalidade mental corresponde a uma mente emocionalmente engajada e intelectualmente saudável.
Uma mente completamente envolvida em atividades significativas, segundo a psicologia positiva do húngaro Mihaly Csikszentmihalyi, criador da teoria do fluxo ("flow"), um estado mental de foco, produtividade e bem-estar. Sua obra “Flow - A Psicologia do Alto Desempenho e da Felicidade” (Objetiva, 2020), “destaca a exatidão do que os filósofos vêm dizendo há séculos: o caminho para a felicidade não está no hedonismo irracional, mas sim no desafio consciente.”
Efetivamente, a vida nos desafia. A condição essencial da existência humana é a de viver enfrentando desafios. Eles moldam quem somos. Afinal, desafios fazem parte do que significa estar vivo. Ao contrário, seremos acomodados e apáticos, como aquelas pessoas desprovidas de recursos interiores, vazias no plano da vida.
A forma como reagimos aos desafios de uma vida pulsante nos define. Não escolhemos todos os desafios que a vida nos impõe, mas podemos escolher como enfrentá-los. Isso é o que molda o caráter. Algumas pessoas se fecham, outras florescem. O desafio pode ser muro ou ponte — depende da nossa atitude. Quando somos mais que as circunstâncias, estamos vivendo. Outros morrem dentro de si e sob aparente viver, abandonam a vida no que ela instiga de desafios e crescimento pessoal.
Aliás, Carl Rogers, em sua psicologia humanista, enfatizou o crescimento pessoal, autenticidade e abertura à experiência, implicando dizer que a mente viva está sempre em processo, nunca estática, no próprio curso da vida pulsante. No seu conceito moderno, pulsão de vida constitui a energia psíquica que alimenta a vontade de aprender, criar vínculos e transformar o mundo. Elementos de criatividade, cooperação e desejo de evolução.
Cuida-se da “fome do absoluto”, do tomista Jacques Maritain, nas exigências de maiores saberes, quando a afirmação socratiana “Eu só sei que nada sei”, desafia-nos sempre. De efeito, a mente ativa é a expressão consciente da pulsão de vida. Uma mente iva, rígida, estagnada se contrapõe à vida que é-nos oferecida como dádiva de Deus. Vida que merece ser recompensada por nossas melhores atitudes.
Jones Figueirêdo Alves é Desembargador Emérito do TJPE. Advogado e parecerista
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