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A 3ª Vara de Sucessões do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – TJRS, declarou a ineficácia de um testamento público lavrado em 2010, após entender que a vontade do testador se tornou incompatível com sua realidade no momento da morte.
A decisão foi proferida em uma ação declaratória ajuizada pela mãe do falecido contra a beneficiária do testamento – que era sua esposa à época da lavratura do documento, mas de quem ele se separou de fato em 2019. O homem faleceu no ano seguinte, em 2020.
No testamento, ele destinava a parte disponível de seus bens à então esposa. A mãe alegou que a ruptura da relação afetiva entre o testador e a beneficiária antes da morte retirava a legitimidade da disposição testamentária. Defendeu, assim, que a vontade expressa no documento havia se tornado ineficaz, uma vez que o filho não teria mantido o desejo de beneficiar a ex-esposa após o fim da convivência.
Ao julgar o caso, a Justiça do Rio Grande do Sul reconheceu que o testamento foi feito quando o vínculo conjugal ainda existia, mas considerou comprovado que tal vínculo deixou de existir ao menos um ano antes do falecimento. A separação de fato foi confirmada por sentença judicial e outros elementos, como a exclusão da ex-esposa do plano de saúde do testador.
A sentença destaca que houve “alteração substancial das circunstâncias” que fundamentaram a disposição testamentária, o que demonstrou a perda de sua eficácia. Além disso, a manifestação de vontade expressa em 2010 não se manteve válida até a morte do testador, em 2020.
A ação foi julgada procedente, e a Justiça determinou a comunicação da decisão ao 2º Tabelionato de Notas de Porto Alegre, responsável pela lavratura do testamento.
Vontade real
As advogadas Bruna Freitas Martins Costa, Luísa Deckmann Malschitzky e Fernanda Rabello, sócias do escritório Fernanda Rabello Advogados, que atuaram no caso, avaliam que a decisão privilegia a vontade real do testador e está em conformidade com a legislação e a jurisprudência. Elas respondem em conjunto.
“É fato que temos tomado, cada vez mais, consciência de que a vida é dinâmica e mutável, e, por conseguinte, a interpretação das questões submetidas ao Judiciário também deve acompanhar essa realidade”, declaram.
Para elas, trata-se de uma decisão inovadora na medida em que são poucos os precedentes consolidados no âmbito do TJRS que declaram a ineficácia do testamento em razão da quebra do objetivo do documento.
“A inovação reside na aplicação, ao Direito das Sucessões, de uma lógica principiológica já conhecida em outras áreas do Direito Privado, especialmente no campo contratual: a ideia de que determinadas disposições perdem sua eficácia quando ocorre a frustração da base que lhes dava e”, explicam.
E acrescentam: “Ao reconhecer que a vontade do testador estava condicionada a um determinado estado de coisas – no caso, a manutenção do vínculo conjugal – e que a alteração dessa realidade – a separação de fato – comprometeu o fundamento objetivo da disposição testamentária, o Judiciário deu um o importante no sentido de flexibilizar a interpretação literal do testamento, afastando o formalismo exacerbado em nome da preservação da verdadeira vontade do testador”.
As advogadas avaliam que o precedente pode inaugurar uma abordagem “mais dinâmica e contextual da sucessão testamentária, capaz de refletir a complexidade das relações humanas e de assegurar a efetividade da autonomia privada”.
Elas destacam que, com esse entendimento, casos em que disposições testamentárias se revelem incompatíveis com a realidade vivida pelo testador após a lavratura do testamento poderão ser analisados à luz dessas mudanças. “Dessa forma, garante-se maior justiça e efetividade às decisões sucessórias, com a preservação da verdadeira e última vontade do testador”, concluem.
Por Guilherme Gomes
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